quinta-feira, 23 de maio de 2013

Medo, insegurança, Fé, fidelidade e convicção

     Quando todas as portas haviam se fechado para o plano de Deus, quando tudo parecia não ir de encontro aquilo que Ele havia previsto aos seus, quando todas as coisas concorriam para que Ele não mais nos colocasse em seus planos, Deus nos surpreende. E onde então Deus fracassou durante toda a história? Se levarmos em consideração, no antigo testamento a história dos reis escolhidos por Ele para Israel, constataremos que aqueles que foram escolhidos, em nada foram fiéis ao que lhes foi confiado. Sendo Deus Onipotente sabia que eles não seriam fiéis, não seriam capazes. Ao todo foram vinte e quatro reis, somente dois (Davi e Salomão) foram dignos do título da fidelidade a Deus. Desses dois, em um somente é possível enxergar tal fidelidade, o outro nem tanto. Esses que foram fieis a Deus (1 Reis 2, 3) e governaram com sabedoria e justiça servindo ao povo (1Reis  12, 7) que pertencia unicamente a Deus (1Reis 3, 8-9).      
É neste mesmo livro dos Reis que dar-se continuidade a história da sucessão, interrompida em 2 Sm 20, 22 com a velhice de Davi. Mesmo sabendo da infidelidade presente em cada um deles, Deus mesmo se faz fidelidade, Deus mesmo é fiel e os confia a condução do seu povo. Este é o fracasso de Deus, um Deus que por hora seria O Onipotente, se curva diante das infidelidades dos seus e quer continuar com eles. O fracasso de Deus é o fracasso de amor pelos seus. Ele é extremamente apaixonado pelos seus. É o fracasso de qualquer ideia de poder, é o fracasso de qualquer princípio de tirania ou ditadura que por hora pudesse surgir, tudo é substituído pelo Amor. Deus quer ser pequeno, Deus quer precisar dos homens.
Ao longo da história da salvação Deus quis sempre precisar dos homens em seu projeto. As mulheres entram em cena logo no primeiro livro. Eva se torna símbolo do pecado, da desobediência e da ambição. Depois dela, Sara. Uma mulher de personalidade vigorosa, longe de ser um mero objeto, sem capacidade de raciocínio ou vontade própria. Pelo contrário, podemos deduzir pelos relatos, que foi uma mulher hábil e decidida. Débora já ocupa um lugar de destaque nas Escrituras. Foi uma profetisa, casada e juíza em Israel (Jz 4, 4-10).
Chegamos á Virgem Maria, a crente! Logo que Maria aparece nas Escrituras já nos causa uma inquietude muito grande. E se aquela virgem não aceitasse o pedido? E se ela se deixasse vencer pelo medo de ser apedrejada? E se dissesse não ao anjo? A jovem de Nazaré é diferente das outras personalidades que aparecem nas Escrituras, ela traz consigo um dado novo, um dado que muda toda a história, a fidelidade (Jo 1, 26-28). Desta fidelidade não se tem dúvida. Não se tem dúvida dos riscos que corria aquela menina ao engravidar na região da Judeia, não se tem dúvida de sua entrega e de seu desprendimento.
Diferentemente das outras mulheres, Maria permanece fiel, mesmo desconhecendo, mesmo não entendendo, mesmo não enxergando por hora o que seria de sua vida, de seus projetos, de seu casamento prometido. A mãe Deus passa pela solidão do medo, mas não da incerteza. Desde o início ela sabia para onde estava indo, pois sabia Quem a estava conduzindo. O silêncio que tão facilmente percebemos nela pode ser traduzido neste medo, nesta angústia do que poderia acontecer com ela. Mas, segue silenciosa, como que com os olhos vendados. É o auge da fidelidade! É o topo da entrega, é o ponto mais alto de toda a história da salvação, é a criatura que mais se abandonou nas mãos do Altíssimo. É Deus sendo gerando em ventre humano. É a encarnação acontecendo.
Atravessando todas as possíveis profecias de dor e sofrimento (Lc 2, 36), a Virgem aparece ao lado da cruz de pé (Jo 19, 25). Não de qualquer forma, não desesperada, não aos gritos ou lamentando. Talvez por dentro estivesse fazendo tudo aquilo, estaria passando por todas aquelas perguntas e desmoronando interiormente. Aqui é interessante observar a luta interior desta mulher. Uma vida inteira de questionamentos, perguntas, mas de certezas Naquele que a havia escolhido, de alegria pela escolha de Deus em sua história (Lc 1, 46).
            Como nos falta este silêncio! Como nos falta esta confiança inabalável naquilo que Deus tem para nós, naquilo que poderia tornar-se uma grande obra, assim como na vida dessa Virgem. O desespero chega logo e bate a nossa porta, nos visita e toma o lugar de Deus, nós nos entregamos facilmente ao medo e não conseguimos chegar até Deus. Em Maria se vê a realização dos desejos de Deus, dela vem Jesus, o Cristo esperado de todos os tempos. Soube ela “desaparecer” em sua contemplação e dar lugar ao menino que crescia e se desenvolvia (Lc 2, 52). Fora ela a primeira a adorar o menino Deus, ensinar-lhes os primeiros passos e conduzir seus primeiros destinos, Aquele que era já ali naquele engatinhar, e é o Caminho, a Verdade e a Vida (Jo 14, 6).
            Que Maria não nos seja distante. Que ela seja sempre aquela que caminha conosco. Oxalá eu pudesse um dia encontra-me com esta mãe... lhe segredaria tanta coisa, lhe perguntaria tanta coisa, sentado ao seu colo, lhe confidenciaria os grandes medos de minha vida e diria ali pertinho o quanto lhe admiro tanto por sua coragem, convicção e fidelidade. Que nos venha o silêncio de Maria, que nos venha sua capacidade de calar-se e confiar, que nos venha sua determinação no abandono, que nos venha sua capacidade de, mesmo diante do medo e da insegurança, chegue até nós a certeza de que é Deus mesmo que nos quer junto, é Deus mesmo quem nos coloca no patamar de escolhidos, mesmo sem que nós mereçamos. Deus não trabalha com merecimentos, Deus trabalha com dignidade humana, presente em todos os que Ele criou.
“Nos momentos mais difíceis, quando nada mais nos parece ser favorável, quando até mesmo o Pai parece nos estar castigando/educando, recorramos á Maria, peçamos-lhe o colo: ‘mãezinha, ponha-me ai do lado deste menino que tão carinhosamente balanças’...”.
            A Virgem que acreditou desde o anúncio do anjo, mudando a história da participação humana no projeto divino, segue o caminho da fidelidade. Agora no auxilio aos filhos, na condução ao Pai.

Ednaldo Oliveira, SDB


Lorena/SP, 24 de maio de 2013.