sábado, 5 de janeiro de 2013

Na espera de um novo olhar




            Pronto! Terminamos mais um ciclo natural e iniciamos outro que nos rouba os primeiros dias e nos joga ao sentimento sempre presente de que tudo podemos e que desta vez conseguiremos. Quando concluímos mais uma etapa da vida a primeira sensação que nos vem em mente é o agradecimento, sentimento que deveria estar presente em todos os momentos, mas, ousa fugir quando algo dá errado. Neste meio termo dentre finalzinho e começo eu revejo algumas ações. Oxalá se nos propuséssemos constantemente a este relatório necessário na correria dos nossos dias normais. Quantas coisas boas acontecem e nos passam despercebidas. Tantas outras coisas que tenderiam a ser nossas se não fossem o nosso medo ou orgulho.
Entretanto, existem coisas que eu não me arrependo. Eu não me arrependo de ter passado por algumas experiências que por hora pareciam indignas e sujas, vergonhosa e com um forte odor de desgraças, desesperançosas e desesperadoras, amargas e gostosas nas sensações mais loucas e inimagináveis, nos medos mais normais e mais tensos, na briga intensa do não encontrar saída para bobagens catastróficas que se transformam facilmente, nos olhares bonitos, porém sem vida e expectativa de continuidade, na esfera dominante e ditadora em nome do contraditório, na busca desenfreada por respostas nunca vindas e ainda esperadas, no ponto final forçado e não desejado, nos perigos enforcadores e aventureiros, na luz que se ascendeu e ainda brilha no arrependimento do desprezo dado, na espera de um outro olhar.
            Passar por tudo isso me fez perceber como facilmente posso cair nas coisas que sei que posso cair, mas, sempre caio por querer cair. E não existe redundância. A nossa vida é assim. A gente conhece bem o caminho, conhece bem as sensações que o nosso interior nos apresenta, sabemos interpretar as consequências de tais atos... e nós ousamos querer cair. Mas, somente um louco desejaria cair, não? Não! Nós gostamos da queda pela massagem que ela executa no lado vítima que existe em nós. E não é bobeira pensar no vitimismo, seu grau mais ferrenho é o astuto que não se deixa anunciar ou estancar. A gente gosta da lágrima que chega de mancinho e demora a ir embora. Não é masoquismo, mas revitalização de um então que nos deixa atentos e nos faz pensar estar atuantes onde não deveríamos, mas quereríamos. 
            Essas coisas são sempre esperadas por todos nós no ordinário dos nossos dias. Nós sempre estamos á procura de aventuras novas e eletrizantes, coisas extraordinárias que nos levem a sensações encantadoras e diferentes. Cada centímetro dessas coisas grandiosas que tão longamente esperamos pode ser que nunca nos chegue. Mas nós ousamos esperar essas coisas, esses dias, esses espetáculos, esses shows, esses brilhos, esses desmoronamentos, esse extraordinário... Em nossa vida nem sempre estaremos com o sol brilhando a nosso favor e por isso, é preciso casar com a senhora rotina. Não com uma sensação frustrante, mas com uma ilusão no sentido espanhol de falar. A “ilusion” que significa novo sol e novos tempos que se aproximam, um novo esperar, uma coisa nova que surge, uma esperança que se aproxima de mansinho. Ninguém vive de aventuras. Nós vivemos mesmo é de coisas repetidas, de mesmices que não se perdem no sentido vulgar da palavra, mas vai sempre além. Afinal, Deus se apresenta, e até vive nos simples fatos corriqueiros. É por isso que nunca O encontramos.
            Reconhecer as graças e as falhas que vão fazendo parte do nosso caminhar é maravilhoso. Quanto mais paramos para observar o tecido que vamos costurando, o tecido de nossa existência, a vida vai se tornando mais ousada e menos sangrenta. A gente vai deixando o costume “safado” de querer ser vítima, a gente vai sendo mais racional na hora que se precisa e mais humano na hora em que dentro de nós surge um grande grito de condenação, não aos nossos atos, mas a nós mesmos. É certo que damos uns tombos feios nas tentativas que escolhemos, e como isso nos faz crescer.  Não me arrependo das coisas que fiz,  me arrependo das vezes que transformei pessoas em coisas, das vezes que fui arrogante jurando ser elegante, das vezes que os atos se transformaram em tempestades desnecessárias por não saber esperar a hora exata (ela sempre chega, mesmo que demore), das vezes em que não fui EU na tentativa de agradar alguém por medo de perder este alguém. Quem acabou se perdendo fui EU.
            Também tenho pena das coisas que perdi e não posso mais voltar atrás. E como pesa essa palavra. Pena é a ultima palavra a ser usada sobre alguém, é humilhante; ninguém quer ser digno de pena. A dor é enorme. Mas, dói mais ainda quando lembro que perdi pessoas fantásticas que deveriam estar ao meu lado até hoje. Tenho certeza que estariam. A vida é assim, a gente faz algumas escolhas e acaba deixando coisas importantes passarem. Seria impossível querer e ter tudo. Aqui reside o cuidado. Quando nós nos tornamos bonequinhos de marionetes nas mãos de alguns tiranos que vão aparecendo no delinear de nossa convivência por aqui, a gente vai acabando como que cego e nada mais vai enxergando. Melhor dizendo, nada mais nos deixam enxergar; e nós aceitamos essa condição.
Por isso, tomemos cuidado com a fascinação que pode estancar em nós qualquer dia desses. Não permita que alguém selecione com quem você pode ou não se relacionar, isso não é amor, é ditadura e pode ser que percamos a fantástica experiência de encontrarmos aquela pessoa que falta aos nossos dias e que certamente esperamos a vida inteira. Tenha certeza, elas existem e eu não fui capaz que escolhê-las no tempo certo. Agora não mais adianta, não mais há tempo e a distância nos faz seguir em frente. Aqueles pequenos pensamentos (no meu caso, grandes pensamentos), que sempre invadem nossas mentes e nos lançam tantas ideias boas, tantos lugares que por hora parecem ser mágicos, mas que nós sempre querermos estar acompanhados. Como é bom estar na companhia de alguém que nos ama. Isso faz parte da natureza humana. Ninguém aguenta viver sozinho, e quem assim se quer viver, torna-se um eterno frustrado e nele nunca se enxerga luz.
            Eu também fui teimoso algumas vezes, ou sempre para falar a verdade, e foi graças a isso que não perdi tudo. Corri o risco de jogar tudo fora, de mudar totalmente, de trocar tudo por aquilo que eu achava ser tudo e hoje vejo que nada ficou. E como fui ousado a ficar com aquilo que eu achei valer a pena lutar e ficar. Também fui criticado, e muito. Nós nunca podemos permitir que alguém nos diga o que escolher ou não. Acho que é por isso que alguns me chamam de arrogante, porque eu nunca permiti que me dissessem o que fazer ou não. E não é que eu não aceite a ideia do outro, mas é que eu não posso ser uma eterna gelatina em suas mãos. Eu espero também que você nunca seja esse líquido viscoso que com o passar dos dias, quando não mais nos agrada nós jogamos no lixo ou pelo ralo da pia. Quero morrer teimoso, quero morrer arrogante na concepção de alguns. O que não quero é ser escravo de ninguém. Não posso permitir que ninguém me roube de mim. 
            É por isso que se torna tão importante o crescimento pessoal, para que eu não permita que alguém me engane sobre mim. E assim a vida vai se tornando realmente uma aventura, mas uma aventura enraizada na realidade do dia a dia e na senhora rotina, porque todo ser humano necessita se sentir seguro antes de desarrumar as malas que os medos jogam por cima de seus anseios e partir para a percepção dos movimentos que os rodeiam para então construir caridade fora de si mesmo. Pois esta é a verdadeira Graça da vida, perceber-se um ser caminheiro em busca de si mesmo.       

Ednaldo Oliveira, SDB
Campos do Jordão/SP, 31 de dezembro de 2012. Retiro Anual dos Salesianos de SP.

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