Pronto!
Terminamos mais um ciclo natural e iniciamos outro que nos rouba os primeiros
dias e nos joga ao sentimento sempre presente de que tudo podemos e que desta
vez conseguiremos. Quando concluímos mais uma etapa da vida a primeira sensação
que nos vem em mente é o agradecimento, sentimento que deveria estar presente
em todos os momentos, mas, ousa fugir quando algo dá errado. Neste meio termo
dentre finalzinho e começo eu revejo algumas ações. Oxalá se nos propuséssemos
constantemente a este relatório necessário na correria dos nossos dias normais.
Quantas coisas boas acontecem e nos passam despercebidas. Tantas outras coisas
que tenderiam a ser nossas se não fossem o nosso medo ou orgulho.
Entretanto, existem
coisas que eu não me arrependo. Eu não me arrependo de ter passado por algumas
experiências que por hora pareciam indignas e sujas, vergonhosa e com um forte
odor de desgraças, desesperançosas e desesperadoras, amargas e gostosas nas
sensações mais loucas e inimagináveis, nos medos mais normais e mais tensos, na
briga intensa do não encontrar saída para bobagens catastróficas que se
transformam facilmente, nos olhares bonitos, porém sem vida e expectativa de
continuidade, na esfera dominante e ditadora em nome do contraditório, na busca
desenfreada por respostas nunca vindas e ainda esperadas, no ponto final
forçado e não desejado, nos perigos enforcadores e aventureiros, na luz que se
ascendeu e ainda brilha no arrependimento do desprezo dado, na espera de um
outro olhar.
Passar
por tudo isso me fez perceber como facilmente posso cair nas coisas que sei que
posso cair, mas, sempre caio por querer cair. E não existe redundância. A nossa
vida é assim. A gente conhece bem o caminho, conhece bem as sensações que o
nosso interior nos apresenta, sabemos interpretar as consequências de tais
atos... e nós ousamos querer cair. Mas, somente um louco desejaria cair, não?
Não! Nós gostamos da queda pela massagem que ela executa no lado vítima que
existe em nós. E não é bobeira pensar no vitimismo, seu grau mais ferrenho é o
astuto que não se deixa anunciar ou estancar. A gente gosta da lágrima que
chega de mancinho e demora a ir embora. Não é masoquismo, mas revitalização de
um então que nos deixa atentos e nos faz pensar estar atuantes onde não
deveríamos, mas quereríamos.
Essas
coisas são sempre esperadas por todos nós no ordinário dos nossos dias. Nós
sempre estamos á procura de aventuras novas e eletrizantes, coisas
extraordinárias que nos levem a sensações encantadoras e diferentes. Cada
centímetro dessas coisas grandiosas que tão longamente esperamos pode ser que
nunca nos chegue. Mas nós ousamos esperar essas coisas, esses dias, esses
espetáculos, esses shows, esses brilhos, esses desmoronamentos, esse
extraordinário... Em nossa vida nem sempre estaremos com o sol brilhando a
nosso favor e por isso, é preciso casar com a senhora rotina. Não com uma
sensação frustrante, mas com uma ilusão no sentido espanhol de falar. A
“ilusion” que significa novo sol e novos tempos que se aproximam, um novo
esperar, uma coisa nova que surge, uma esperança que se aproxima de mansinho.
Ninguém vive de aventuras. Nós vivemos mesmo é de coisas repetidas, de mesmices
que não se perdem no sentido vulgar da palavra, mas vai sempre além. Afinal, Deus
se apresenta, e até vive nos simples fatos corriqueiros. É por isso que nunca O
encontramos.
Reconhecer
as graças e as falhas que vão fazendo parte do nosso caminhar é maravilhoso.
Quanto mais paramos para observar o tecido que vamos costurando, o tecido de
nossa existência, a vida vai se tornando mais ousada e menos sangrenta. A gente
vai deixando o costume “safado” de querer ser vítima, a gente vai sendo mais
racional na hora que se precisa e mais humano na hora em que dentro de nós
surge um grande grito de condenação, não aos nossos atos, mas a nós mesmos. É
certo que damos uns tombos feios nas tentativas que escolhemos, e como isso nos
faz crescer. Não me arrependo das coisas
que fiz, me arrependo das vezes que
transformei pessoas em coisas, das vezes que fui arrogante jurando ser
elegante, das vezes que os atos se transformaram em tempestades desnecessárias
por não saber esperar a hora exata (ela sempre chega, mesmo que demore), das
vezes em que não fui EU na tentativa de agradar alguém por medo de perder este
alguém. Quem acabou se perdendo fui EU.
Também
tenho pena das coisas que perdi e não posso mais voltar atrás. E como pesa essa
palavra. Pena é a ultima palavra a ser usada sobre alguém, é humilhante;
ninguém quer ser digno de pena. A dor é enorme. Mas, dói mais ainda quando
lembro que perdi pessoas fantásticas que deveriam estar ao meu lado até hoje.
Tenho certeza que estariam. A vida é assim, a gente faz algumas escolhas e
acaba deixando coisas importantes passarem. Seria impossível querer e ter tudo.
Aqui reside o cuidado. Quando nós nos tornamos bonequinhos de marionetes nas
mãos de alguns tiranos que vão aparecendo no delinear de nossa convivência por
aqui, a gente vai acabando como que cego e nada mais vai enxergando. Melhor
dizendo, nada mais nos deixam enxergar; e nós aceitamos essa condição.
Por isso, tomemos cuidado
com a fascinação que pode estancar em nós qualquer dia desses. Não permita que
alguém selecione com quem você pode ou não se relacionar, isso não é amor, é
ditadura e pode ser que percamos a fantástica experiência de encontrarmos
aquela pessoa que falta aos nossos dias e que certamente esperamos a vida
inteira. Tenha certeza, elas existem e eu não fui capaz que escolhê-las no
tempo certo. Agora não mais adianta, não mais há tempo e a distância nos faz
seguir em frente. Aqueles pequenos pensamentos (no meu caso, grandes
pensamentos), que sempre invadem nossas mentes e nos lançam tantas ideias boas,
tantos lugares que por hora parecem ser mágicos, mas que nós sempre querermos estar
acompanhados. Como é bom estar na companhia de alguém que nos ama. Isso faz
parte da natureza humana. Ninguém aguenta viver sozinho, e quem assim se quer
viver, torna-se um eterno frustrado e nele nunca se enxerga luz.
Eu
também fui teimoso algumas vezes, ou sempre para falar a verdade, e foi graças
a isso que não perdi tudo. Corri o risco de jogar tudo fora, de mudar
totalmente, de trocar tudo por aquilo que eu achava ser tudo e hoje vejo que
nada ficou. E como fui ousado a ficar com aquilo que eu achei valer a pena
lutar e ficar. Também fui criticado, e muito. Nós nunca podemos permitir que
alguém nos diga o que escolher ou não. Acho que é por isso que alguns me chamam
de arrogante, porque eu nunca permiti que me dissessem o que fazer ou não. E
não é que eu não aceite a ideia do outro, mas é que eu não posso ser uma eterna
gelatina em suas mãos. Eu espero também que você nunca seja esse líquido
viscoso que com o passar dos dias, quando não mais nos agrada nós jogamos no
lixo ou pelo ralo da pia. Quero morrer teimoso, quero morrer arrogante na
concepção de alguns. O que não quero é ser escravo de ninguém. Não posso
permitir que ninguém me roube de mim.
É
por isso que se torna tão importante o crescimento pessoal, para que eu não
permita que alguém me engane sobre mim. E assim a vida vai se tornando
realmente uma aventura, mas uma aventura enraizada na realidade do dia a dia e
na senhora rotina, porque todo ser humano necessita se sentir seguro antes de
desarrumar as malas que os medos jogam por cima de seus anseios e partir para a
percepção dos movimentos que os rodeiam para então construir caridade fora de
si mesmo. Pois esta é a verdadeira Graça da vida, perceber-se um ser caminheiro
em busca de si mesmo.
Ednaldo Oliveira, SDB
Campos do Jordão/SP, 31 de dezembro
de 2012. Retiro Anual dos Salesianos de SP.
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